terça-feira, 30 de março de 2010

Pela janela do carro


Neste último final de semana, ao rever Brasília, agora com olhos de futura jornalista, tive a sensação de estar em uma cidade sem comunicação. Humana, bem entendido. A ausência de semáforos transforma as ruas da cidade em longas autoestradas. É certo que nos tira o desconforto de ter de parar a cada cruzamento, mas também nos priva do prazer de observar as coisas e pessoas a nossa volta.

Gosto desse hábito urbano de caminhar nas calçadas, conhecer os lugares a pé, me perder e me achar. Em Brasília, isso fica difícil. Vocês podem argumentar que a capital verde-amarela não é o lugar mais apropriado para flâneurs, que eu deveria ter ido para Olinda, Rio de Janeiro ou Ouro Preto, mas não é sempre que a nossa agenda casa com o nosso imaginário.

"Aqui tudo é grandioso", afirmou minha amiga Regina após um comentário sobre o amplo lobby do hotel onde eu estava hospedada. Assim são também os clubes e restaurantes, todos projetados sem levar em conta o controle de natalidade em tempos pós-modernos.

E foi com esse espírito hiper-over-mega-plus que eu me vi, ora devorando um risoto de morango com camarões no ótimo Oliver, no Clube de Golfe, na companhia da minha querida prima Paulinha, que eu não via há seis anos, ora clicando as mansões da "Península dos Ministros". De dentro do carro, é claro!

Puxo na memória o que mudou na paisagem de Brasília desde a primeira vez que a vi. Os prédios de arquitetura arrojada já podem ser considerados "antigos", a vegetação está mais bela, as árvores atingiram a meia-idade com o viço próprio dos seres bem cuidados.

Na cabeça da maioria dos brasileiros, Brasília pode não ter tido alteração alguma. Continua sendo, para o poder público pelo menos, um lugar de passagem. Sem cruzamentos. Visto principalmente pela janela do carro.

quinta-feira, 25 de março de 2010

Assim caminha a arte


O artista plástico cearense Vando Figueirêdo abriu sua exposição "Caminhos", dia 17 último, durante a inauguração do Espaço Cultural Porto Freire, dentro do Parque del Sol, na Cidade dos Funcionários, em Fortaleza.

A mostra é composta de 11 obras em acrílica sobre tela e outras técnicas, e mais 17 obras de seus vários períodos de criação. As primeiras fazem parte da coleção "Recortes de Portugal", pensada pelo artista a partir do seu olhar durante viagens ao país europeu. As demais tratam-se de 17 obras dos vários períodos de criação do artista. ``Eu gosto de trabalhar em várias linguagens. A pós-modernidade nos trouxe esta liberdade``, afirmou Vando.

O curador da galeria, o também artista plástico Roberto Galvão, explica sobre os dois espaços do centro cultural: no Cubo Branco é possível apreciar as criações de forma isolada, e no Arte Vida, cada obra é escolhida de acordo com o seu ambiente.

Além da galeria de artes plásticas, o Espaço Cultural Porto Freire disponibilizará para o público auditório e local para lançamento de livros e discos, além de cursos e outras atividades.

SERVIÇO
Caminhos - Até 30/4
Local: Espaço Cultural Porto Freire (Parque Del Sol & Cidade dos Funcionários).
Visitação gratuita de terça a sexta, das 9 às 19h; e aos sábados e domingos, das 14 às 19h.
Mais informações: (85) 3459 0061 / 0062
matéria escrita a partir do site
http://opovo.uol.com.br/opovo/vidaearte/964880.html



domingo, 14 de março de 2010

Salve-se quem puder!












Era o dia internacional dedicado à mulher. A jovem empresária Marcela, após cumprir sua devoção na igreja que frequentava, foi confraternizar com a mãe e outras amigas. Na volta para casa, arrancaram-lhe o direito de continuar na missão de ajudar os que precisam, de produzir, de amar, enfim, de viver com dignidade e simplicidade.

"Temos que blindar os carros!" Ouvi de uma amiga, em momento de indignação, enquanto comentávamos sobre o caso que abalou Fortaleza na semana passada. Simples assim? Quanto se chega a tal conclusão, é sinal de que estamos abandonados à própria sorte. Salve-se quem puder e tiver grana para blindar o carro. E quanto ao nosso direito constitucional de ir e vir em segurança? A quem apelar ou responsabilizar?

Fiquei pensando. E que tal se o governo pagasse a blindagem? Essa seria uma medida emergencial, é claro! Blindar o carro sem combater as causas da violência é como tratar da nossa queimadura sem apagar o incêndio que vai queimar outras pessoas. Sabemos que o assunto é complexo e requer campanhas e projetos mais duradouros.

Quem vai, então, apagar o fogo? Sociedade civil e governo precisam arregaçar as mangas de camisas de grife compradas compulsivamente nos shopping centers de Miami. Não dá para continuar assim.

Quantas Marcelas ainda pagarão com a vida diante do descaso de todos nós? Porque sabemos que não é só honrar os impostos e esperar que o governo cumpra a sua parte. Cadê a fiscalização cidadã? Isso dá trabalho, daí porque nem todos se habilitam.

Não tivemos nada o que comemorar neste 8 de março. Em nome de todas as vítimas da violência urbana de ontem e de hoje, vamos lutar para um dia podermos festejar não só as mulheres, mas toda a humanidade. Antes que garotos nos surpreendam na rua com uma arma apontada para a nossa cabeça. A próxima vítima pode ser qualquer um de nós.









terça-feira, 2 de março de 2010

Restaurante classe A com atendimento classe trash

Sabe quando você sai de casa feliz da vida, com toda a família, para provar aquela comida que sua filha lhe falou a semana inteira? Foi com esse espírito gourmet que fomos parar sábado à noite num restaurante classe A de Fortaleza. Enquanto esperávamos por nossa mesa de seis lugares, sentamos no bar para uns drinques, e começamos a xeretar o cardápio. É esse o prato! Não vejo a hora!

Agora, já bem instalados no aconchegante espaço do restaurante propriamente dito, começamos a fazer os pedidos, quando o garçom informa: "Esse prato só pode ser servido lá fora, no bar". "Mas eu comi aqui dentro na semana passada!", argumenta minha filha. "Foi uma exceção", responde o moço, e complementa: "O cardápio aqui dentro é outro". "Chama seu gerente para ver se ele pode abrir outra exceção!", suplica minha filha.

Minutos depois, ouvimos uma voz atrás de nós: "Vocês não querem comer lá fora?". Era a chef de cozinha perguntando do alto dos seus cursos gastronômicos e sotaque de outra região do país. "Não, obrigada, já estamos sentados, gostamos mais deste ambiente".

"Por que não pode servir aqui dentro? Já estamos no fim da noite, o restaurante está quase vazio, qual o problema?", insistimos. "O prato lá fora custa menos, não posso servi-lo aqui dentro", ela respondeu irredutível. Nessa hora, todo o encanto rolou escada abaixo (o restaurante-bar fica no mezanino de um fino estabelecimento comercial). A carruagem virou uma abóbora e todos nós perdemos os sapatos.

Por mim, teria ido embora naquela hora, mas meu marido resolveu insistir: "Cobre mais caro, então!". Ao que ela rebateu: "Você não sabe como é cearense... Não é facil! Trabalho nesta terra há muitos anos e sei como é... Não vão querer pagar mais pelo mesmo prato, só porque é aqui dentro!".

Não temos o hábito de sair por aí alterando cardápios e normas de restaurantes. Mas, convenhamos, em tempos de customização e leis de mercado, não custa adaptar um menu ao gosto do cliente. Pelos meus cálculos de ex-marketeira, o proprietário teve um preju da ordem de R$ 100 mil: um jantar mensal para seis pessoas (R$ 400,00) x 12 meses x 20 anos. Se mais clientes pensarem da mesma forma, em pouco tempo o restaurante desaparece e a orgulhosa chef vai ter que voltar para sua terra, de onde nunca deveria ter saído.

Resumo da noite: engolimos a comida, o desaforo e as piadas, fomos para casa e juramos nunca mais por os nossos pezinhos no lugar. A chef tem razão: nós , cearenses, somos mesmo muito estúpidos!